Retirado de Mercado Ético
Um acordo político entre partidos governistas e a oposição prevê a votação do novo Código Florestal para a terceira ou quarta semana de abril. O adiamento da votação da lei ambiental estava prejudicando a pauta de outro assunto de grande importância para o governo, a Lei da Copa, com a oposição se negando a votar até que a questão do Código Florestal fosse acertada. Com a marcação da votação do Código, o governo conseguiu a aprovação da Lei da Copa na Câmara.
A votação do Código Florestal estava originalmente marcada para 6 e 7 de março. Porém, com uma campanha forte da sociedade civil e ONGs contra a votação do projeto de lei da forma como está sendo conduzida, sem debates populares e científicos, e pelo veto da presidente Dilma, a votação ficou sem data durante quase todo o mês de março.
O texto costurado pelo relator Paulo Piau (PMDB-MG) isenta pagamento de multas, amplia o desmatamento sobre áreas preservadas e beneficia o desmatador.
Com a Rio +20 batendo em nossa porta, o governo ficaria em uma posição muito delicada se o projeto de lei fosse aprovado na Câmara e seguisse para sanção presidencial. Por esta razão, além de reivindicado por ambientalistas, o adiamento para depois da Rio +20 seria algo estratégico para o governo não ter sua imagem prejudicada no momento desta importante conferência internacional.
“Por um lado, esse acordo representa uma ameaça para a consolidação do cenário de não votar antes da Rio+20, pois, apesar de ser difícil, existe a possibilidade real de a votação ocorrer mesmo no final de abril caso a campanha do veto esfrie e a mobilização social sofra um refluxo”, ressaltou Kenzo Jucá, da WWF Brasil.
“Entendemos essa nova data como uma ‘tentativa’ do governo e dos ruralistas: se tudo estiver tranquilo até lá e parte dos ambientalistas se comprometerem a apoiar vetos parciais após a votação para diminuir o estrago na imagem do governo, a votação pode realmente ocorrer”, alerta.
Ou seja, as pessoas precisam se mobilizar mais do nunca para mostrar à presidente o seu apoio para não destruir uma legislação construída ao longo de tantos anos, com esforços imensos por partes diversas da sociedade brasileira. Movimentos sociais já planejam uma série de atividades para o mês de abril visando sensibilizar as pessoas e apoiar a presidente no veto.
Além do Código Florestal, a bancada ruralista, com o apoio de muitos outros setores que ficam à sua sombra, estão bombardeando outros marcos da legislação ambiental.
Na semana passada, a Comissão de Meio Ambiente da Câmara rejeitou o PL 2441/07, de autoria do Deputado Celso Maldaner (PMDB/SC) e relatoria do Deputado Irajá Abreu (PSD-TO, filho de Kátia Abreu), que visava acabar com a Lei da Mata Atlântica.
Porém, a luta nesta frente ainda será grande, já que o PL está destinado a passar na Comissão de Constituição e Justiça, e os Deputados Irajá Abreu e Valdir Colatto (PMDB-SC) já disseram que irão brigar por sua aprovação.
Outro disparate votado recentemente na Câmara, uma vitória da bancada ruralista e evangélica, foi a aprovação na Comissão de Constituição Justiça e Cidadania no dia 21 da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215/2000.
O objetivo da PEC é levar para o Congresso Nacional a demarcação e homologação de terras indígenas, quilombolas e de unidades de conservação, que conforme a Constituição Federal é atribuição do Poder Executivo. A proposta segue agora para Comissão Especial e o movimento indígena está mobilizado.
E o que muda para as cidades?
O que grande parte da população não enxerga é que o ambiente urbano, além do rural, também será muito prejudicado pelas atuais mudanças no Código Florestal. O setor imobiliário é um dos maiores interessados nas alterações da legislação e em muitas cidades há depoimentos dos sindicatos de construção civil, ávidos para que o PL seja aprovado conforme saiu da Câmara em maio de 2011, sem menção alguma à questão urbana.
O texto do Código Florestal aprovado pelo Senado, que agora está sendo analisado na Câmara, institui o Regime de Proteção das Áreas Verdes Urbanas, com regras que preveem a manutenção de pelo menos 20 metros quadrados de área verde por habitante em novas expansões urbanas. Os municípios teriam até 10 anos para rever o plano diretor e leis municipais de uso do solo.
O texto do Senado também concede poder aos conselhos municipais do meio ambiente para definir as faixas mínimas de mata ciliar em rios que cortam as cidades, que deverão respeitar a área de passagem de inundação.
O substitutivo prevê ainda a regularização fundiária de assentamentos existentes em Áreas de Preservação Permanente onde não há risco para a população, desde que seja mantida uma faixa não edificável com largura mínima de 15 metros de cada lado do rio.
Organizações da indústria tambémtêm feito lobby para excluir do Código Florestal dispositivos que preveem a proteção de vegetação em áreas urbanas. Piau já sinalizou que acolherá as demandas, segundo uma reportagem para a Folha de S.Paulo.
Entretanto, por mais que as cidades tenham áreas extremamente artificiais, elas também abrigam muitos remanescentes importantes de ecossistemas naturais. O bioma Mata Atlântica, extremamente ameaçado com as mudanças na legislação, concentra a maior parte da população brasileira, cerca de 120 milhões de pessoas, e hoje está reduzido a cerca de 7% da sua área original.
O Código Florestal, ao lado do Estatuto da Cidade, é o instrumento que, ao menos, minimiza esse processo de retração, argumenta o Instituto Socioambiental (ISA). É ele que impede o avanço da fronteira urbana em restingas, encostas, brejos e falésias, lagunas, manguezais, margens de rios, entre outros locais definidos como áreas de preservação permanente devido à importância que possuem para a integridade de processos ecológicos e para a segurança e o bem-estar humano. A proteção dessas áreas, entretanto, está em risco.
Nabil Bonduki, urbanista e secretário de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente, argumentou em uma entrevista para a Agência Senado que o capítulo sobre as áreas urbanas é necessário para sistematizar as questões específicas dessas áreas – e, especialmente, das Áreas de Preservação Permanente (APPs) localizadas nessas regiões – e também para ‘dialogar’ com outras legislações específicas, como é o caso do Estatuto das Cidades, da lei que trata do parcelamento do solo urbano e da legislação decorrente da Política Nacional de Habitação.